Firmina - O Brasil é um Estado laico. O que isso significa na prática?
Oi, pessoal, tudo bem? Começamos nesta semana as atividades da Checazap Firmina, nossa agência de checagem de fatos sobre cultura e educação, acelerada pelo programa Diversidade nas Redações, da Énois Jornalismo. Nós vamos enviar as checagens toda semana neste grupo do whatsapp, mas aproveito para trazer um texto da Anna Ortega nesta edição da Firmina sobre a laicidade do Estado brasileiro, além da nossa curadoria de sempre.
Um abraço,
Thaís Seganfredo,
editora
Checazap Firmina
A chegada do período eleitoral no Brasil favorece o debate de temas que dividem candidatos e espectros políticos. É o caso da descriminalização do aborto, do ensino religioso nas escolas e da formação das frentes religiosas nas câmaras, como a banca evangélica. Esses temas são tensionados pelo entendimento de que política e religião não podem se misturar, pois esse é o princípio de um Estado laico como o Brasil. Mas o que isso significa na prática? Para o Brasil, a laicidade quer dizer que não há uma religião oficial que rege o país, ou seja, é inconstitucional que qualquer religião interfira em decisões estatais. O Estado laico, também chamado de secular ou não confessional, baseia-se no respeito e proteção de todas as religiões e filosofias de vida.
O primeiro país ocidental a ser considerado laico são os Estados Unidos, pois a Constituição Americana promulgada em 1787 - anterior a Revolução Francesa, já separava o Estado da Igreja. A laicidade foi instaurada no Brasil mais de um século depois, em 1891. Antes disso, a própria Constituição de 1824 instaurava a religião católica apostólica romana como religião do Império. “Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior de templo”, dizia o art. 5º da Constituição de 1824. A liberdade era restrita e o culto público a outras religiões era proibido no Brasil.
A instauração do Estado Laico também significou uma liberdade de expressão assegurada pelo Estado de forma mais direta. O artigo 220 da Constituição de 1988 diz que: “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”. A laicidade garante, então, dois direitos principais concetados: a separação entre Estado e Igreja; e a liberdade e proteção da crença. Um Estado laico não deve divulgar determinada religião, mas assegurar que todas tenham o direito de existir.
Existem estados não-laicos, ou confessionais, no mundo contemporâneo, como a Grã-Bretanha, o Irã, Israel e a Dinamarca, que têm religiões privilegiadas pelo poder público. No caso desses, o Cristianismo de Confissão Anglicana, o Islamismo, o Judaísmo e o Cristianismo de Confissão Luterana. Porém, o fato de um estado ser ou não-laico, não significa que eles atuem da mesma maneira. Um exemplo é a descriminizalização do aborto em Países da Grã-Bretanha, como a Inglaterra, a Escócia e o País de Gales, onde é permitido fazer um aborto até a 24ª semana de gestação. Nesses países, o sistema público de saúde britânico (NHS) oferece pílulas de interrupção da gravidez para pessoas gestantes até a 10ª semana.
O Estado laico não é sinônimo de Estado Ateu. Segundo o Observatório de Laicidade da UFF, o Estado Ateu se posiciona contra práticas religiosas, proibindo e perseguindo quaisquer cultos. “Se não consegue proibi-la completamente, dificulta ao máximo suas práticas, inibe sua difusão e desenvolve contínua e sistemática propaganda anti-religiosa. A União Soviética e os Estado socialistas constituídos no leste europeu, assim como a República Popular da China estabeleceram regimes ateus, com base na concepção de que toda e qualquer religião seria fonte de alienação do povo”, exemplifica o grupo de pesquisa.
Liberdade religiosa
Mãe Patrícia, líder de um templo de matriz africana em Feliz (RS), acusa a prefeitura de omissão após um deslizamento de terra em abril destruir o local, afetando cultos e um projeto social. Em entrevista ao Sul21, ela denunciou racismo religioso pela falta de ação do poder público, que não providenciou a limpeza do terreno, mesmo após repetidas reivindicações. Quatro meses após as chuvas, o local permanece inacessível, levando Mãe Patrícia a buscar apoio de órgãos públicos e planejar um protesto no desfile de 7 de setembro, que acabou cancelado devido ao mau tempo.
O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação da advogada Ana Paula Sanches ao pagamento de R$ 20 mil por danos morais coletivos por incitar ódio religioso contra muçulmanos em postagens no Instagram. A ação foi movida pela Associação Nacional dos Juristas Islâmicos (ANAJI) após Sanches afirmar que muçulmanos explodem e torturam cristãos. A 7ª Câmara de Direito Privado considerou que a advogada ultrapassou os limites da liberdade de expressão, ofendendo a comunidade muçulmana. (Migalhas)
Reportagem do Marco Zero destaca que nas comunidades quilombolas de Rio dos Paus e São Raimundo, em Alcântara, Maranhão, crianças mantêm vivas tradições ancestrais, como brincadeiras e rituais do Tambor de Mina. A instalação do Centro Espacial de Alcântara, desde 1983, não trouxe benefícios significativos para essas comunidades e intensificou as desigualdades. Com apenas sete escolas atendendo mais de 120 localidades quilombolas e a falta de creches, a infraestrutura educacional é insuficiente. Apesar das carências, a religiosidade desempenha um papel crucial na vida das crianças, que são imersas na cultura e espiritualidade locais desde cedo.
Liberdade educacional
Uma professora da Escola Municipal Tiradentes, em Queimados, Baixada Fluminense, foi afastada após denúncias de postagens racistas em suas redes sociais, incluindo frases como “a penalidade para quem comete racismo contra brancos deveria ser morar na África”. A docente, que é negra, alegou que as postagens foram tiradas de contexto e tratavam de “doutrinação ideológica”. O g1 procurou a professora, mas não obteve resposta. A Secretaria Municipal de Educação abriu um procedimento disciplinar e solicitou seu afastamento para investigação. Em nota, a Prefeitura de Queimados repudiou o incidente e reafirmou seu compromisso com a educação antirracista.
A família de um estudante de 14 anos do Colégio Bandeirantes, que se suicidou em 12 de agosto, pediu à Justiça acesso às imagens da escola para comprovar que ele sofria bullying. O adolescente, atacado por ser gay, negro e de origem humilde, havia enviado um áudio sobre os abusos. A escola pode revisar sua parceria com a ONG Ismart, que ainda não prevê alterações na colaboração. O Colégio Bandeirantes e o Ismart foram procurados pelo Metrópoles, mas ambos afirmaram não ter informações adicionais no momento.
Estudantes do ensino médio no Pará pediram melhorias na educação pública, incluindo a eliminação da discriminação e o acesso a materiais didáticos de qualidade. O estado receberá a caravana do Ministério da Igualdade Racial (MIR) para discutir ações afirmativas e promoção da igualdade racial nas escolas. O Instituto Alana apoia a iniciativa, que visa construir planos de ação para enfrentar desigualdades no acesso à educação. Alunos entrevistados pelo portal Lunetas destacaram a importância das ações afirmativas, como a lei de cotas e o programa Pé-de-meia, e relataram experiências de racismo nas escolas, reforçando a necessidade de uma educação antirracista mais robusta.
Liberdade artística
O candidato à prefeitura de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) afirmou nesta quarta (11) que quer banir das escolas municipais livros que estão “deturpando a ideologia”. A fala foi realizada em resposta à Folha quando o candidato visitava a Bienal do Livro. Ao veículo, Marçal disse que “ tudo o que for deturpar a produtividade, o crescimento, a liberdade a gente também vai banir. O ensino sempre foi pautado pelo comunismo, a gente vai dar uma mudadinha nisso aí”.
A Lei Federal de Incentivo à Cultura, ou Lei Rouanet, é frequentemente mal interpretada e alvo de desinformação, especialmente em épocas eleitorais. O Nonada verificou as principais mentiras espalhadas sobre esse mecanismo crucial para o fomento à cultura.